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Quando recebi a encomenda de Alécio Rossi para a criação de uma peça para sustentar a exposição “Senac Faz Arquitetura”, fui surpreendido pela demanda: uma estrutura o mais leve possível, de montagem rápida e ágil, e que dialogasse com a herança tecnológica, estética e cultural da chamada “Arquitetura Móvel”.

Minha pesquisa vem tratando especificamente da possibilidade de um ambiente urbano em que a transitoriedade seja uma característica bem-vinda, e não apenas um empecilho à “boa arquitetura”. A Arquitetura Móvel procura participar de um ambiente urbano que compreende ser temporário, inacabado, aberto a intervenções. Os chamados “eventos culturais” – exposições, shows, espetáculos, museus, etc. – envolvem a multiplicidade e a transitoriedade que são inerentes à vida. Os espaços de exposição são, em si, uma das maiores demandas pela arquitetura móvel, flexível e/ou adaptável. Alguns dos sistemas construtivos mais versáteis e, por outro lado, menos adequados à sensibilidade ambiental como configurada em nossa cultura contemporânea, são aqueles comuns nas estruturas de sustentação de eventos: andaimes, montantes, praticáveis, sistemas estruturais comuns em feiras e exposições, e tão desprezado pelos arquitetos e cenógrafos, e com toda razão – dado o papel auto-imposto de “inexpressivo suporte de imagens e ambientes temporários”.

O desafio foi o de propor uma estrutura portante que, além de sustentar mecanicamente as belíssimas imagens da exposição, fotografadas por Gal Oppido, também criasse uma ambiência adequada, apresentando um discurso arquitetônico contemporâneo e crítico. A imagem que norteou o projeto foi o da arquitetura contemporânea acolhendo a herança modernista e eclética da arquitetura estabelecida tradicional.

A proposta sintetizou-se em um conjunto de tetraedros tracionados que articulam-se em um ambiente estendido, superando a mera sustentação das imagens. Cada tetraedro é composto por hastes de madeira associadas por pequenas peças de aço, que se fixam mutuamente por meio de cabos de aço revestido, compondo um poliedro tênsil. Essa estrutura suporta uma série de “varais” nos quais penduram-se as fotografias. O espaço resultante é, apesar de geometricamente regular, inadvertido à sensibilidade tradicional, que espera o arranjo ortogonal dotado dos alinhamentos familiares, confortáveis à visão treinada, desde a infância, pela ambiência urbana estabelecida. Essa abordagem arquitetônica promove uma ambiência diferenciada, voltada para a composição de espaços visualmente inusitados, e promove a sensação de acolhimento provido por uma cobertura não hermética, como sob as copas de árvores.

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(foto: Maurício Montel)

Buckminster Fuller desafiava o público de suas palestras a adivinhar o peso do edifício em que se encontravam, e contrastava a provável ignorância dos engenheiros e arquitetos, quanto a isso, com o domínio técnico e prático que engenheiros navais e aeronáuticos – assim como os pilotos – da massa deslocada de seus navios e aeronaves. A massa total deste espaço expositivo é de menos de 700kg, fornecendo cobertura para uma área de 180m2, aproximadamente (sendo que mais da metade dessa massa está nas sapatas de ancoragem; a massa total dos tetraedros é de 300kg, aproximadamente). A mesma área coberta, se estruturada em alvenaria, superaria uma massa de 100 toneladas, mesmo sem paredes ou fechamentos.

Essa comparação simples, mesmo que impressionante, pode parecer apenas uma questão técnica, mas é concretamente, e primeiramente, uma questão econômica. Em segundo lugar, uma questão ecológica e de sustentabilidade ambiental. Em terceiro, uma questão perceptual, estética e, em suma, cultural.

É possível que, no futuro, venhamos a colocar a alvenaria estrutural, entendida como panacéia para a construção do ambiente, no mesmo conjunto de práticas muito criticáveis em que colocamos o motor a explosão e o automóvel. O espaço urbano conta com a ilusão de perenidade da construção civil tradicional, e compreendemos o ambiente urbano como um dado, um cenário estático, sobre o qual desempenhamos nossa vida, não como um campo de ação participativo e coletivo. Creio que essa passividade advém, em parte, da imobilidade do ambiente, a qual comparece em todas as esferas da vida urbana – desde a estrutura jurídica (“bens imóveis”), e práticas arquitetônicas do vernáculo contemporâneo (“alteração” do ambiente como sinônimo de “demolição” de elementos arquitetônicos), compondo a cosmologia urbana estabelecida (“cenário” e não “campo de ação”).

Muito além de ser uma questão tecnológica, a mobilidade da arquitetura e do ambiente urbano é uma questão cultural, perceptual e poética. Esta foi uma oportunidade de apresentar um exemplo, mesmo que sucinto, da arquitetura que provavelmente acompanharia uma mudança da cultura urbana para um modo mais afeito à transitoriedade.

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Ficha técnica:

Projeto: Caio Vassão.

Produção, Coordenação de Fabricação e Montagem: Marília Silveira.

Protótipo: Dalton Nunes, Maurício Montel e Caio Vassão

Fabricação: Maurício Montel, Dalton Nunes, José Almino e Mauricio de Souza.

Coordenação de Montagem: Erik Klaus, Mauricio Montel, Marília Silveira.

Montagem: Erik Klaus, Paulo Band, Maurício de Souza.

Arquitetura, Mobilidade, Ambiência e Tecnologia.

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